O escritor Márcio Souza, que apelidou Gilberto Mestrinho de Boto Tucuxi – apelido este que ficou mais conhecido que o próprio nome de batismo do dono -, atravessou o espelho. Por coincidência, este ano o jingle em forma de toada “Feitiço do Boto Navegador”, apelido que Gilberto assumiu de vez em 1996, completou 24 anos.
Ali começava a saga local – ele já era conhecido a nível nacional – de um dos maiores escritores contemporâneos do mundo. Márcio Gonçalves Bentes de Souza nasceu em Manaus, em 4 de março de 1946. Além de escritor ele era jornalista, dramaturgo, editor e roteirista. O velório será no Palácio Rio Negro, a partir das 16h, ele deve ser enterrado na terça-feira (13).
Um gênio
Através da paródia e da inversão entre o alto e o baixo, Márcio Souza, em “A Resistível ascensão do Boto Tucuxi”, carnavaliza a política brasileira, e a escolha por retratar a política dessa forma é interessante, pois o autor brinca com essa esfera da vida social que deveria ser regida pela seriedade e honestidade, mas que, particularmente no Brasil, é, muitas vezes, comandada por motivos baixos, escusos e ilegais.
Márcio mistura a lenda do boto amazônico, animal que se transforma em um belo rapaz para engravidar as moças ribeirinhas, com o costume que havia na época, dos políticos “emprenharem” às urnas no transporte do interior até Manaus.
Reza a lenda que Gilberto Mestrinho chegou a perseguir Márcio, que supostamente, se autoexilou no Sul, fato negado por ambos anos depois, mas que faz parte do imaginário político local.
De ribeirinho a imperador
Galvez, Imperador do Acre, junto a Mad Maria, é um romance que começou a ser escrito por em 1966/68, com o propósito de redigir um roteiro cinematográfico. Entre idas e vindas, o texto somente foi publicado em 1976, marcando o início da carreira literária do artista e conferindo-lhe o prêmio de escritor revelação da Associação Paulista de Críticos de Arte.
Segundo a crítica, Galvez, Imperador do Acre é uma obra herdeira da estética fragmentária adotada pelo escritor modernista Oswald de Andrade, com cenas descontínuas, simultâneas, em uma espécie de linguagem telegráfica, que remete justamente ao roteiro de um filme, mesclando ainda a paródia, a sátira e a alegoria, que se achavam em voga nos anos 1960 e 1970, tão comum nas obras de Márcio Souza.
Leitura obrigatória
Galvez, Imperador do Acre foi indicado como leitura obrigatória para o vestibular da Universidade de Rondônia, em sua edição de 2011 e para o vestibular da Universidade Federal de Roraima, conforme consta no Manual do Candidato de 2015.
O cineasta Hector Babenco, ao falecer em 2016, deixou pronto o roteiro do filme Galvez, Imperador do Acre, baseado no romance homônimo. A obra romanesca de Márcio foi levada ao palco por Carlos Canhameiro, com a participação de artistas como Ana Carolina Godoy, Fabricio Licursi, Mariana Goulart, entre outros.
Honoris Causa
Em 2022, a Universidade Federal do Amazonas, por meio de seu Conselho Universitário (Consuni), outorgou o título de ‘Doutor Honoris Causa’ a Márcio Souza, em reconhecimento ao trabalho que tem feito em promover a cultura, especialmente a amazonense, em suas obras.
Obra
Aqui publicamos alguns livros seus, pois para publicar todos, seria necessária uma edição especial: Mostrador de Sombras, UBE/Amazonas e Editora Sérgio Cardoso. 1969. Galvez – Imperador do Acre, Edições Governo do Estado.
A Expressão Amazonense, Editora Alfa-ômega, São Paulo. 1977. Operação Silêncio, Editora Civilização Brasileira, Rio de Janeiro. 1978. Teatro Indígena do Amazonas, Editora Codecri, Rio de Janeiro. 1979, Mad Maria, Editora Civilização Brasileira, Rio de Janeiro. 1980 Tem Piranha no Pacu, Editora Codecri, Rio de Janeiro. 1980 e A Resistível Ascensão do Boto Tucuxi, Editora Marco Zero, Rio de Janeiro. 1982, dentre outras.