Meu nome é Ranulfo, nome que ganhei de herança do meu avô; eu era viciado em drogas e sempre me reunia com a galera lá da rua Urucará, perto do Habib’s para dar uns ‘tapas’ e cheirar pó, mas larguei o vício depois que ela chegou. Estou contando minha história aqui porque procurei um pastor e ele disse que eu estava oprimido e orou na minha cabeça e coisa e tal, mas não estou, não. Meu apelido lá na Praça da Polícia é Ranô, então se eu desaparecer e sair a notícia nos jornais vocês já sabem quem foi.
O nome dela é Johanni Lecter e ela apareceu um dia lá no casarão abandonado da Avenida Sete de Setembro, bem perto da ponte e sentou do nosso lado. Ela trouxe uma garrafa de vinho tinto, caro, e ofereceu para a gente. Ela trajava um trench coat preto e botas altas negras, da cor dos cabelos dela, com jeitão de gótica e ficou lá com a gente. Estranhamos o nome dela, o mesmo do Hannibal Lecter e as roupas, inapropriadas para o clima de Manaus. Ela disse que tinha um problema de resfriação do sangue e sempre sentia um frio intenso. Trazia uma máquina fotográfica a tiracolo pois era fotógrafa. Disse que tinha vindo para Manaus no navio de cruzeiro MS Sirena, gostou daqui e ficou.
No outro dia ela apareceu. Tinha um sotaque engraçado parecendo estrangeira. Disse que era da Romênia mas acho que era da Ucrânia pelos traços e por falar, de vez em quando, palavras russas, como ‘tovarish’, que ela dizia significar “companheiro”. Levou umas garrafas de vinho e começamos a beber. Capotamos e quando acordamos, ela tinha ido embora, mas o Ringo, nosso amigo, estava morto ao lado, sem um pingo de sangue e com duas marcas de mordida na garganta.
Saímos de lá e ficamos uns dias sem aparecer. A polícia encontrou o corpo dele mas abafou o caso; disse que ele tinha morrido de overdose. O Gero, outro amigo nosso que acabou sem sangue e morto, lembrou que ela disse que morava na Betânia e foi atrás dela. O corpo dele apareceu num bueiro, todo desmembrado. Novamente a polícia disse que era guerra entre o A FDN e o CV.
Só que mais corpos foram aparecendo com bilhetes escritos a mão para despistar, dizendo que o cara morreu porque era X9 mas é papo; sabemos que foi ela. Assim, cada um de nós foi morrendo, só restando eu e o Vladimir. Ontem à noite eu acordei com umas batidas na janela e olhei pelo vidro e a vi sorrindo para mim, me chamando lá fora.
Eu sei que o próximo sou eu por isso estou escrevendo este relato antes dela me pegar. Sei que ela é uma vampira pois uma vez me cortei com o vidro da garrafa de vinho tentando abrir sem saca-rolhas e ela pegou meu dedo e sugou tanto o meu sangue que eu já ia desmaiando. Outra vez tiramos duas fotos dela com o celular mas depois quando fomos ver, ela estava toda suja de sangue na foto, mas quando fizemos a foto ela estava real. Ela anda pelo Centro da cidade pela área do Parque Jefferson Péres. É muito falante e sempre anda com a máquina fotográfica do lados, mas é só para disfarçar. Soube pelos portais de notícias que outros casos estão acontecendo em Manaus e sei que é ela.