O incêndio que vitimou mais de 30 famílias no Bairro do Céu, deixando cerca de 270 pessoas sem eira nem beira, na Aparecida, só veio mostrar, mais uma vez, que a moradia em palafitas, tão conhecidas em Manaus, no estado, no Brasil e em países asiáticos, cedo ou tarde acaba em tragédia. Moradores de palafitas de Manaus vivem expostos a doenças, vivendo em meio ao lixo acumulado sob as palafitas e à água poluída, decorrente também do esgoto, sendo os locais preferidos para assaltos e tráfico de drogas. Bairros como o Educandos, por exemplo, continuam do mesmo jeito quando da fundação da cidade.
Nas conhecidas “casas caneludas”, os moradores convivem diariamente em contradição, uma vez que a água que é vista constantemente pelas janelas é escassa nas torneiras. Isso acontece porque todo encanamento é improvisado feito de maneira irregular, possuindo uma tubulação frágil, muitas vezes substituídas por mangueiras de jardinagem. Mas as palafitas não são uma realidade somente no Amazonas ou Pará; em São Paulo o maior desses assentamentos é a favela do Dique da Vila Gilda, conhecida por ser a maior favela com palafitas do Brasil, com população estimada em 6 mil famílias ou 22 mil pessoas vivendo sobre a água.
“São anos e anos vivendo nessa situação. Meus pais moraram aqui, eu e agora meus filhos. Ainda temos esperança de conseguir uma casa em algum desses Prosamins”, sonha Edite Silva, 58, filha de um carpinteiro naval que nasceu e morreu em uma dessas casas, em Educandos.
“Isso aqui não é vida não. Tenho fé em Deus que vou sair daqui com os meus filhos”. A frase da dona de casa Maria Márcia Gonçalves, 38 anos, dá a dimensão da total precariedade em que vivem as famílias moradoras da comunidade Igarapé do 40.
Uma das cenas mais comuns é ver crianças brincando no meio do lixo acumulado sob as palafitas e na água poluída, decorrente também do esgoto lançado no igarapé. Vidros de pimenta, garrafas PET, pedaços de madeira, restos de comida, potes de margarina e latas de cerveja lotam a área, onde proliferam insetos e animais, colocando em risco a saúde da população.
“Aqui é cobra, rato, barata, mosquito. Tudo de ruim. Além do mau cheiro que, quando chove, fica ainda pior, ainda tem a água que, quando o rio enche entra nas casas”, continuou Márcia. Nesses locais as mais prejudicadas são as crianças, que frequentemente ficam doentes e apresentam sinais de diarréia, febre, vômito, dengue e malária.
A empregada doméstica Adriana Baraúna, 24 anos, tem duas filhas e também reclama das doenças frequentes. Ela disse que já perdeu a conta das vezes que precisou correr para um dos postos de saúde da região porque as meninas estavam com febre ou diarréia. Segundo ela, sempre foi bem atendida nas unidades próximas.
“A sorte é que elas nunca tiveram dengue, mas vômito e diarréia sempre têm. É muito perigoso viver aqui com elas, mas não tive escolha. O problema é que o povo também não tem educação e joga lixo em qualquer lugar”, disse, enquanto atravessava uma ponte improvisada com pedaços de madeira, onde funciona uma peixaria que divide o espaço com o lixo, a água poluída e os insetos.
A prefeitura de Manaus informou que o Igarapé do 40 está sendo atendido com obras de revitalização pelo Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus (Prosamim), do Governo do Estado. Já a assessoria do governo do Amazonas informou que mais de 20 igarapés da cidade estão recebendo obras e ações socioambientais, por meio do Prosamin, entre eles o Igarapé do 40, que integra a Bacia de Educandos.